Dr. Saulo Maia 

 Médico Psiquiatra

CREMERS 39347

O que é Síndrome de Asperger / Autismo de Alto Funcionamento ?

Nem tudo que sai da linha e, portanto, é “atípico”, deve ser necessariamente  “inferior”.

 

 - Hans Asperger (1938)

 

 

          Atualmente usamos o termo Autismo de Alto Funcionamento para designar a Síndrome de Asperger, denominada em reconhecimento as descrições notavelmente perspicazes do Dr. Hans Asperger, um pediatra vienense, que, em 1944, notou que algumas das crianças encaminhadas para sua clínica tinham características de personalidade e comportamento muito semelhantes. Ele observou que a maturidade e o raciocínio social destas crianças estava atrasado ​​e que alguns aspectos das suas capacidades sociais eram bastante incomuns em qualquer fase do seu desenvolvimento.

 

              As crianças tinham dificuldade em fazer amigos e eram frequentemente vítimas de bullying por outras crianças. Havia prejuízo na comunicação verbal e não verbal, especialmente nos aspectos conversacionais da linguagem. O uso da linguagem pelas crianças era pedante e algumas crianças apresentavam uma entonação incomum que afetava o tom e o ritmo da fala.

 

A gramática e o vocabulário podiam ser relativamente avançados mas, no final da conversa, tinha-se a impressão de que havia algo de incomum na capacidade de se ter uma conversa típica que seria esperada com crianças daquela idade. Asperger também observou e descreveu dificuldades evidentes na comunicação e no controle das emoções, e uma tendência a intelectualizar os sentimentos.

 

             A empatia não era tão madura como seria de se esperar, levando-se em conta a capacidade intelectual destas crianças. As crianças também tinham uma preocupação central com um tema ou interesse específico que dominava seus pensamentos e seu tempo. Algumas crianças apresentavam dificuldade em manter a atenção nas aulas e possuiam problemas específicos de aprendizagem.

 

Asperger observou que muitas vezes estas crianças precisavam de mais assistência e auxílio em habilidades organizacionais por parte de suas mães do que seria de se esperar. Ele descreveu uma notável falta de jeito em termos de coordenação motora e que algumas crianças eram extremamente sensíveis a determinados sons, aromas, texturas e toques.

 

 

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Hans Asperger (1906-1980)

Asperger considerou que as características poderiam ser identificadas em algumas crianças de dois a três anos de idade, embora para outras crianças as características só se tornassem mais evidentes alguns anos depois. Ele também notou que alguns pais, especialmente os pais dessas crianças, pareciam compartilhar algumas características de seus filhos.

 

Ele observou que algumas das crianças tinham talentos específicos que poderiam levar a um empregos bem-sucedidos e algumas poderiam desenvolver relacionamentos saudáveis para toda a vida.

 

 

Quando o reconhecimento dos primeiros sinais ocorre na adolescência

          À medida que a criança atinge a adolescência, os mundos social e acadêmico tornam-se mais complexos e existe a expectativa de que a criança se torne mais independente e autossuficiente. Nos primeiros anos escolares, o jogo social tende a ser mais ação do que conversa, sendo as amizades transitórias e os jogos sociais relativamente simples, com regras claras. Na adolescência, as amizades baseiam-se em necessidades interpessoais mais complexas do que em necessidades práticas, em alguém em quem confiar e não em alguém com quem jogar bola.

Nos primeiros anos escolares, a criança tem um professor durante todo o ano e tanto o professor como a criança aprendem a ler os sinais um do outro e a desenvolver uma relação de trabalho. Há também mais orientação, flexibilidade e leniência em relação ao currículo escolar e à maturidade social e emocional esperada. A vida é relativamente simples e a criança pode ter menos consciência de ser diferente das outras crianças, e as suas dificuldades podem não ser visíveis na sala de aula ou no playground.

 

            Durante a adolescência, é provável que um adolescente com Síndrome de Asperger tenha dificuldades cada vez mais evidentes com competências de planejamento e organização, e com a conclusão de tarefas a tempo. Isso pode levar a uma deterioração nas notas escolares que chamam a atenção de professores e pais. As capacidades intelectuais do adolescente não se deterioraram, mas os métodos de avaliação utilizados pelos professores mudaram.

O conhecimento da história não é mais lembrar datas e fatos, mas organizar um ensaio coerente. O estudo do inglês exige habilidades de caracterização e de ‘ler nas entrelinhas’. Pode-se esperar que um grupo de estudantes apresente um projeto de ciências e o adolescente com Síndrome de Asperger não é facilmente assimilado por um grupo de trabalho de estudantes. A deterioração das notas e o consequente estresse podem levar o adolescente a ser encaminhado ao psicólogo escolar que pode reconhecer sinais da Síndrome de Asperger.

 

          Os sinais da Síndrome de Asperger são mais evidentes em momentos de stress e mudança, e durante a adolescência ocorrem grandes mudanças nas expectativas e nas circunstâncias. A criança pode ter lidado bem com as suas particularidades durante a pré-adolescência, mas as mudanças na natureza da amizade, na forma do corpo, nas rotinas escolares e no apoio pode precipitar uma crise que alerta os pais e responsáveis para a descoberta da Síndrome de Asperger em uma criança que anteriormente não apresentava dificuldades.

 

            A adolescência é também um momento de reavaliação de quem se é e quer ser. A influência dos pais na vida do adolescente diminui e o poder e a identificação com o grupo de colegas e amigos aumenta. Espera-se que o adolescente se relacione com muitos professores, cada um com a sua própria personalidade e estilo de ensino, e que se envolva em uma avaliação acadêmica que se baseia no pensamento abstrato e não em fatos. Problemas com a inclusão social, a aceitação e o sucesso acadêmico podem precipitar um quadro de depressão ou raiva dirigida aos outros ou ao “sistema”.